Kerley Carvalhedo

Só a vida não basta

Hoje, reorganizando minha estante de livros, me deparo com algumas pérolas da literatura: Divina Comédia – Dante, Madame Bovary – Flaubert, Cem Anos de Solidão – Gabriel Garcia Márquez, Vermelho e o Negro – Stendhal, entre outros encontrados em uma feira do livro pelo País.

Hoje, reorganizando minha estante de livros, me deparo com algumas pérolas da literatura: Divina Comédia – Dante, Madame Bovary – Flaubert, Cem Anos de Solidão – Gabriel Garcia Márquez, Vermelho e o Negro – Stendhal, entre outros encontrados em uma feira do livro pelo País.

De lá pra cá, não vi nenhum movimento literário que reunisse tantas pessoas como naquela época. Lembro-me bem de muitos participantes, como editores, críticos, agentes literários, jorna- listas, professores e, claro, leitores assíduos como eu. Todos os anos era tradição: garimpar pelos estandes de livros. A cada achado uma vibração, era como se estivesse encontrado diamantes. Lembro-me, por exemplo, que conheci obras irrefutáveis de autores brasileiros como: João Ubaldo Ribeiro, Antônio Torres, Nélida Piñon, Luis Fernando Verissimo, Zuenir Ventura, Moacyr Scliar, Ivan Junqueira, Antonio Cicero, Bernardo Carvalho e outros mais novos. Hoje é pura nostalgia. É sombrio saber que a literatura (que nos faz pensar e criticar) não é levada a sério em vários lugares do Brasil. Já disse em entrevistas sobre isto: a literatura é capaz de nos mostrar muito, nas entrelinhas, nuances e vieses que possui. Sei que nos faltam apoio e incentivos, entretanto o que nos põe a pensar sobre nossa precariedade é que precisamos mais que nunca nos aproximar do conhecimento canônico. Contudo, somos cada vez mais periféricos no sentido de termos de literatura.

Certa vez, conversando com fotógrafo Daniel Mordzinski (fotógrafo conhecido no meio literário brasileiro), ele comentou que faltava mesmo um pontapé inicial. Esse primeiro passo já foi dado quando ganhamos notoriedade no mercado literário pelas páginas dos noticiários. Há quem ache a literatura e o incentivo ao conhecimento “investimento sem retorno”. Talvez a situação do País só comece a mudar quando começarmos a pensar no futuro, fazendo as escolhas certas no cenário político atual em que vivemos. Há os que preferem a remediação de uma sociedade desvalida.

Falta-nos isto: estrutura e visão progressiva. Precisamos de mais conferências, mesas-redondas, lançamentos de livros, sessões de poesia, teatro, cinema, encontros de escritores com estudantes, entregas de prêmios. Precisamos enriquecer o nosso património cultural vivo.

Eu, assim como muitos outros escritores, faço o papel de formiguinha, indo aos colégios, quando convidado, para levar a literatura e o incentivo à leitura às novas gerações, buscando a leitura como algo prazeroso e fundamental. Sempre que posso vou com muito prazer.

Quero ter a certeza de que o amanhã será melhor para todos nós. Não quero entrar e olhar para milhares de volumes de livros nas bibliotecas empoeiradas, mal frequentadas deste país. Quero mais do Brasil, quero um país de muitos brasileiros bem informar dos, que não negocie sua dignidade a troco de banana. Quero muitas feiras, salões e sebos de livros por aí.

É possível sim viver sem o amor aos livros, mas é ter a certeza de uma vida mais miserável e limitada. Já dizia o velho poeta Ferreira Gullar: “A arte existe porque a vida não basta”

Imagem/Pexels